domingo, 22 de dezembro de 2013

Ser mau não é tão ruim

Estamos frente a frente em pleno sábado chuvoso. Disse a ele que poderia ser invasiva com minhas perguntas. Um singelo “Vamos começar” surgiu como resposta. Desde o início aqueles olhos castanhos estavam fixados nos meus, pareciam desafiar os limites da minha sagacidade como entrevistadora. Eles passavam mensagens como quem diz “Será que hoje você vai desvendar meus segredos?”. Foi nesse clima instigante que entrevistei Alessandro Rodrigues. 

O ator, veterano no teatro, se julga uma pessoa má. E, ao contrário do que muitos pensam, trata essa característica como uma vantagem. “Todo mundo tem um lado bom e um lado mau. Tenho certeza que meu lado mal é mais aflorado. E não me critico por isso”. Alessandro consegue ver pureza na sua maldade, pois o ajuda a detectar seus pontos fortes e conhecer mais as pessoas à sua volta.




Em cena, o intérprete do enfermeiro “Jurandir” – de “O Vovô Viu a Uva” – vive um jovem interesseiro que tenta abocanhar a herança de seu “Hipólito” (Ed Júnior) usando charme e vigiando os passos de seus rivais em potencial.  Rodrigues diz que adora ser vilão e, assim como seu personagem, acha que a vida é como um jogo de interesses “e danço conforme a música”, diz o ator. 


O ator Alessandro Rodrigues como Jurandir ao lado de Rita (Lamylle Mello)

A primeira vez que foi um mal sedutor foi em “O Marido da Minha Mulher” (2010). Ele formava par com a atriz Danielle Caetano, amiga de longa data que, atualmente, é “Jorja” na peça do grupo Atos. Porém, a sina de vilão vem desde sua estreia no teatro profissional em 2000, com a peça "Que História é Essa". Desde então já viveu seres místicos como duendes e bruxas, momento em que descobriu sua paixão por peças infantis.


Alessandro e Danyelle Caetano em 'O Marido da Minha Mulher'

"Trabalhei em uma produtora artística como ator em montagens maravilhosas, a maioria de clássicos da Disney. Cresci e amadureci bastante, porque a criança é um espectador sincero, se não gosta diz na cara. Me sinto livre em espetáculos infantis, na minha carreira guardo com muito carinho a peça ‘Dona Ursa  Faz Quitutes’ que tinha um enredo legal e o elenco era demais!”. 

'Dona Ursa Faz Quitutes', um dos trabalhos infantis que Alessandro mais gostou  


                                                                          Retrato da estreia de Alessandro no mundo teatral

Nessa estrada teatral, Alessandro já se transportou para o Nordeste em “A Feira”, peça com montagem do grupo capixaba Vira-lata cujo texto era rico em rimas e palavras do vocábulo nordestino; E até se utilizou de móveis humanos em “O Casamento”, um de seus trabalhos ao lado da diretora, autora e atriz Margareth Galvão, que contava com um cenário vivo formado por mais de dez atores a interpretar objetos, enredo baseado na teoria de Brecht.


 Peça em que Alessandro divide cena com Ed Júnior

'O Casamento', peça que trata de amor e avanços tecnológicos

Quando se trata de projetos futuros, Rodrigues confessa que deseja fazer musicais e ser crítico de cinema e se prepara para isso. Em 2014 voltará às aulas de canto já na sétima arte sempre assiste longas de diferentes gêneros e nacionalidades, e o drama é o que mais o arrebata. Criou também um hábito de acompanhar vários seriados ao mesmo tempo. “Costumo ver a primeira temporada de cada seriado, a segunda, terceira e assim sucessivamente até acabar. Atualmente me revezo entre dez seriados”, revela. Veja os seriados que nosso ator curte: 




Intenso, Rodrigues afirma que a arte de interpretar é prioridade em sua vida. Ao invés de o teatro se adaptar aos demais compromissos, são os demais compromissos que se adaptam ao teatro. Isso faz com que seja mais prático nos relacionamentos. Nada de se envolver com quem não goste de teatro, nada de namorar alguém do elenco, nada de se apaixonar perdidamente, nada de casamento, nada de ter filhos, nem mesmo se relacionar com pessoas influentes no ramo artístico em busca da fama. Apesar disso declara que “carreira se sobressai a amor, porque amores vêm e vão”.

Nas telonas ficaria careca, apareceria nu, também viveria personagens gays com uma ressalva: “Para retratar o cotidiano homoafetivo não precisa escancarar no sexo. Acho desnecessário uma cena explícita de uma transa. Tem alguns elementos que já insinuam o que vai rolar, não precisa escancarar. Para fazer uma cena rasgada assim, o diretor teria de me convencer de que é um mal necessário. Se for uma denúncia aos casos de violência sexual, como estupro, dependendo do contexto, posso pensar no caso”. Ele relata que não tem desejo de interpretar pessoas que viveram na época da ditadura, uma fase por ele considerada muito pesada.





Aos 35 anos, o capixaba diz que já se prepara para ficar mais velho. “Eu não janto, não como frituras, não tomo refrigerante ou coisas pesadas à noite. Quando tiver 40 anos vou começar a surfar bodyboard. Acho que em pé ainda não tenho coordenação motora. Quero ser mais saudável, já reparou o preparo físico de quem surfa?”, comenta. Alessandro Rodrigues ainda deixa um recado para quem quer entrar no mundo do teatro: 

“Não tenho padrão de beleza convencional. Não sou rostinho de novela, mas amo e invisto na atuação. Se você quer entrar pra fazer teatro capixaba, não entre. Você tem que ter certeza de que quer aquilo, porque teatro você tem que abrir mão de tudo”.



Por Tais de Hollanda

2 comentários:

  1. Fico feliz em ver aqui retratado parte da vida artística deste grande ator. Tenho certeza que seus desejos serão realizados pois encara tudo com persistência e profissionalismo. Desejo a este você Alessandro Rodrigues sucesso.

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  2. Alessandro Rodrigues, a primeira vez que ouvi esse nome foi durante a produção da peça 'Doursa Faz Quitutes', confesso que de início não sentia muita firmeza, mas tudo foi esquecido ao vê-lo atuar. Um ator de propriedade e compromissado, foi um grande achado para a peça e sem dúvidas é uma grande figura para o teatro Capixaba e nacional. Você merece o sucesso, merece ser bem sucedido! Torço muito por você meu caro. Haja com responsabilidade com a arte, assim como tem feito.
    Adorei essa reportagem, gostaria de ver mais dessa com o restante dos integrantes do grupo.

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